Santa Maria na Sena Madureira?
Jefferson
Tramontini*
Recentemente
presenciamos a tragédia ocorrida na boate Kiss, em Santa Maria (RS), que
incendiou ceifando a vida de mais de 200 jovens. Após o ocorrido e a grande
comoção que, naturalmente, se seguiu, uma onda de fiscalizações e novas
legislações sobre casas de espetáculos tem tomado conta do país. Infelizmente
foi preciso a dor de toda uma cidade, compartilhada por todo o Brasil, para que
algo fosse feito para evitar que essa tragédia se repita.
Ao menos
podemos crer que, daqui em diante, teremos mais seguranças nesses locais, onde
as pessoas vão para se divertir. Mas será que é apenas em tais estabelecimentos
que corremos riscos desse tipo? São inúmeros os locais em que grandes
quantidades de pessoas frequentam sem se atentar para a segurança. São
mercados, grandes lojas, estádios, shopping centers, igrejas, escolas, bancos,
etc.
Em grande
parte desses estabelecimentos, para proteger seus lucros, os proprietários
instalam um sem número de impedimentos para a saída dos clientes. Em nossas
escolas, o que se vê em regra, são estudantes e trabalhadores trancados como em
uma cadeia, normalmente com pouca ou nenhuma proteção ou treinamento contra
incêndios ou outros incidentes graves.
Tomaremos
como exemplo da falta de atenção à segurança das pessoas um prédio localizado
no centro de Fortaleza, capital do Ceará. O conhecido Edifício-Sede da Caixa
Econômica Federal é um verdadeiro estudo de caso sobre segurança, ou melhor,
sobre a falta dela.
Inúmeras
foram até aqui as denúncias por parte do Sindicato dos Bancários do Ceará sobre
a temeridade de se manter mais de 500 trabalhadores em uma edificação sem condições
de segurança, porém, até aqui, pouco foi realmente feito para corrigir tais
problemas.
Lembramos
que tratamos da sede local não de qualquer entidade, mas de um banco que lucrou
mais de R$ 5 bilhões em 2011 e, apenas nos primeiros nove meses de 2012,
acumulou R$ 4,2 bilhões.
No prédio,
localizado à rua Sena Madureira, são constantes as falhas nos parcos três
elevadores que atendem seus dezoito andares. Diversos são os relatos de pessoas
que ficam presas no interior deles. O sistema de ar condicionado apresenta
problemas crônicos, deixando de funcionar de tempos em tempos. Os banheiros são
dignos de um boteco mal cuidado e as faltas de água já não são surpresa para
mais ninguém.
A unidade
da Caixa possui bombeiros civis e Comissão de Prevenção de Acidentes (CIPA),
mas as centenas de trabalhadores que lá cumprem suas jornadas todos os dias não
possuem treinamento ou informação sobre combate a incêndios. As escadas,
estreitas e mal iluminadas, até recentemente não tinham sequer corrimões e diversas
de suas portas corta-fogo tem maçanetas quebradas ou simplesmente não fecham.
Presume-se que os extintores estejam sempre com a validade em dia, porém,
segundo informações, nenhuma gota d’água passa pelas tubulações dos hidrantes e
sprinklers. Além disso trata-se de um local com milhares de equipamentos elétricos
e toneladas de material inflamável.
Até o
presente a Caixa Econômica Federal tem se limitado a respostas protocolares e a
reformas estéticas. A única “grande” mudança foi a tardia instalação de
catracas para permitir apenas a pessoas autorizadas o acesso às dependências.
Em quantas
outras unidades de grandes empresas os trabalhadores são diariamente expostos a
condições insalubres e a riscos inexplicáveis de segurança? E o que os órgãos
de fiscalização das prefeituras, estados, e mesmo as superintendências do
trabalho tem feito a respeito?
Será
necessária outra tragédia para que providências sejam tomadas? Quantos bancários,
terceirizados, estagiários, aprendizes e clientes terão de sofrer as consequências
de um desastre para que, finalmente, sejam solucionadas as graves deficiências
de segurança do Edifício-Sede da Caixa no Ceará?
Ficaremos
na torcida para que uma nova tragédia não aconteça. Para que não tenhamos mais que
nos solidarizar à dor de famílias que perderam seus entes queridos pela
ganância ou descaso de alguns.
Mas não em
silêncio. Os trabalhadores e sindicatos devem denunciar tais mazelas e lutar,
de todas as formas, para que novas tragédias não comovam a todos e, somente
assim, sejam tomadas medidas necessárias e urgentes.
*Jefferson
Tramontini é diretor do Sindicato dos Bancários do Ceará, membro da Coordenação
Nacional dos Bancários Classistas (CTB) e autor do blog Classista.
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