sexta-feira, 14 de junho de 2013

A passeata, a repressão e os progressistas


J. Tramontini*

Protestos referentes ao transporte público tem ocorrido em várias cidades brasileiras, no entanto, o caso da capital paulista é emblemático. As manifestações, seguidas de dura repressão policial tem levado o clima de caos à maior cidade do país.

Inicialmente, o Movimento Passe Livre (MPL) convocou as passeatas reivindicando a revogação de R$0,20 de aumento nas tarifas de transporte público. A essa reivindicação inicial juntaram-se outras, nem sempre de interesse da maioria do povo, é verdade. O que temos visto é uma extrapolação do objetivo inicial para atender aos mais diversos interesses. As manifestações ganharam uma amplitude e diversas organizações e movimentos tem passado, gradativamente, a integrar os protestos, que só aumentam em proporções.

Parece óbvio que organizações de extrema esquerda tentaram aproveitar a oportunidade para canalizar sua política contrária à aliança democrática que governa o Brasil a dez anos e São Paulo a seis meses, jogando água no moinho da direita reacionária. Mas isso não é novidade. A nova é a tática da direita reacionária, que passou a mobilizar seus “jovens conservadores” a irem às ruas. Também é verdade que as manifestações tem atraído milhares de pessoas, em especial jovens, que querem, simplesmente, o direito à cidade, o direito a ter voz, a existir.

Com essa miscelânea de vontades, não é por acaso que a organização que convoca as passeatas não consiga manter um eixo de reivindicação capaz de unificar todo esse conjunto em uma só voz. Mas nada justifica o que vem ocorrendo, destacadamente nesta última quinta-feira, dia 13 de junho.


Primeiro com relação às forças de repressão. Importante salientar que a Polícia Militar é comandada pelo governador do estado de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB). Já na concentração, coisa inimaginável em tempos de democracia, manifestantes que chegavam passavam por revista, como se fossem adentrar uma penitenciária. Dezenas já haviam sido presos antes mesmo de iniciar a passeata, alguns por portar uma arma perigosíssima, o vinagre, usado para aliviar os efeitos do gás lacrimogênio. Entre os detidos, vários jornalistas. Onde estão os arroubos pela liberdade de imprensa por parte das grande empresas de comunicação? O governo paulista é tucano, esse já é outro assunto.

Quando a passeata se aproximava da Avenida Paulista, palco tradicional das manifestações populares em São Paulo, a Polícia Militar decidiu que o povo não poderia prosseguir. E a força repressora, pois a PM não é nem nunca foi para segurança pública, fez o que sabe, abriu fogo contra a multidão. Não importa se foram usadas as chamadas armas não letais, pois elas não são inofensivas, nem de longe. A partir da truculência policial, a passeata pacífica passou a ser um campo de guerra. Muitos feridos, muitos detidos. Entre os detidos, diversos acusados por formação de quadrilha. Nada mais absurdo. Se reunir em uma manifestação por direitos agora é crime. Mas as polícias militares são velhas conhecidas dos movimentos populares, ainda mais sob ordens de governos de direita.

A violência policial contra os manifestantes é triste, revoltante, mas não surpreendente. O que surpreende, neste caso, e é ainda mais revoltante, é a postura adotada pela prefeitura da cidade de São Paulo, governada pela aliança democrática, capitaneada por Fernando Haddad (PT). O prefeito resolveu ser irredutível, e expressar-se por meio de notas ou coletivas de imprensa. Afirma que não negocia de jeito nenhum o aumento da tarifa, como se isso fosse demonstração de força e firmeza. Não percebeu que os R$0,20 de aumento não significa mais nada, o problema é maior e mais profundo. José Eduardo Cardozo (PT), ministro da justiça do governo Dilma, ainda deu uma forcinha. Colocou a Polícia Federal para investigar os manifestantes e vem dando declarações seguidas ao gosto dos que tem bico grande.

O método conservador não serve a quem se pretende progressista. Se é para fazer como sempre fez a direita brasileira, não precisa disputar eleições com ela. O prefeito Haddad, e seus aliados, não entendeu que o centro da questão não está no aumento da passagem, mas no direito do povo à cidade e, agora, no direito a se manifestar. A tática de não dialogar somente levará ao aumento dos protestos, e pior, ao aumento da força da parcela conservadora presente aos protestos. É um tiro no próprio pé.

Os confrontos acontecem às vésperas da Copa das Confederações, momento em que o mundo todo está olhando para o Brasil. As grandes empresas de comunicação, nacionais e estrangeiras, tem tentado mostrar um clima de caos, como se o Brasil estivesse em situação semelhante ao Egito de 2011. Isso não é a verdade e não é por acaso. Cabe perguntar, quem é favorecido com toda essa confusão, nesse momento? Alguém tem que avisar aos governantes ditos progressistas que se trata da luta de classes em curso.

E é exatamente por se tratar da luta de classes que é preciso que os governos progressistas abandonem o método dos reacionários, que se contraponham a eles. É por se tratar de luta de classes que os movimentos organizados, sindical, estudantil, comunitário, etc., tem que engrossar as manifestações, usando seu poder de mobilização e organização, deixando de ficar a reboque de governos, quaisquer que sejam. Os partidos de esquerda tem que orientar seus militantes a tomarem parte desse processo, urgente. É com a ação política, com a mobilização popular, que será possível segregar os conservadores e reacionários que tem tomado parte das manifestações, unificando o povo em torno de reivindicações de maior alcance, colocando a direita na defensiva.

Mas para isso, as forças populares precisam deixar de priorizar os governos, que são muito importantes, mas não são o todo. É necessário organizar o povo, mobilizar o povo para avançar rumo a um país mais justo, onde a juventude, os trabalhadores tenham direito às suas cidades, tenham direito a ter sua voz ouvida.

*Jefferson Tramontini é diretor do Sindicato dos Bancários do Ceará, membro da coordenação nacional dos Bancários Classistas (CTB) e autor do blog Classista

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