A passeata, a repressão e os progressistas
J. Tramontini*
Protestos referentes ao
transporte público tem ocorrido em várias cidades brasileiras, no
entanto, o caso da capital paulista é emblemático. As
manifestações, seguidas de dura repressão policial tem levado o
clima de caos à maior cidade do país.
Inicialmente, o
Movimento Passe Livre (MPL) convocou as passeatas reivindicando a
revogação de R$0,20 de aumento nas tarifas de transporte público.
A essa reivindicação inicial juntaram-se outras, nem sempre de
interesse da maioria do povo, é verdade. O que temos visto é uma
extrapolação do objetivo inicial para atender aos mais diversos
interesses. As manifestações ganharam uma amplitude e diversas
organizações e movimentos tem passado, gradativamente, a integrar
os protestos, que só aumentam em proporções.
Parece óbvio que
organizações de extrema esquerda tentaram aproveitar a oportunidade
para canalizar sua política contrária à aliança democrática que
governa o Brasil a dez anos e São Paulo a seis meses, jogando água
no moinho da direita reacionária. Mas isso não é novidade. A nova
é a tática da direita reacionária, que passou a mobilizar seus
“jovens conservadores” a irem às ruas. Também é verdade que as
manifestações tem atraído milhares de pessoas, em especial jovens,
que querem, simplesmente, o direito à cidade, o direito a ter voz, a
existir.
Com essa miscelânea de
vontades, não é por acaso que a organização que convoca as
passeatas não consiga manter um eixo de reivindicação capaz de
unificar todo esse conjunto em uma só voz. Mas nada justifica o que
vem ocorrendo, destacadamente nesta última quinta-feira, dia 13 de
junho.
Primeiro com relação
às forças de repressão. Importante salientar que a Polícia
Militar é comandada pelo governador do estado de São Paulo, Geraldo
Alckmin (PSDB). Já na concentração, coisa inimaginável em tempos
de democracia, manifestantes que chegavam passavam por revista, como
se fossem adentrar uma penitenciária. Dezenas já haviam sido presos
antes mesmo de iniciar a passeata, alguns por portar uma arma
perigosíssima, o vinagre, usado para aliviar os efeitos do gás
lacrimogênio. Entre os detidos, vários jornalistas. Onde estão os
arroubos pela liberdade de imprensa por parte das grande empresas de
comunicação? O governo paulista é tucano, esse já é outro
assunto.
Quando a passeata se
aproximava da Avenida Paulista, palco tradicional das manifestações
populares em São Paulo, a Polícia Militar decidiu que o povo não
poderia prosseguir. E a força repressora, pois a PM não é nem
nunca foi para segurança pública, fez o que sabe, abriu fogo contra
a multidão. Não importa se foram usadas as chamadas armas não
letais, pois elas não são inofensivas, nem de longe. A partir da
truculência policial, a passeata pacífica passou a ser um campo de
guerra. Muitos feridos, muitos detidos. Entre os detidos, diversos
acusados por formação de quadrilha. Nada mais absurdo. Se reunir em
uma manifestação por direitos agora é crime. Mas as polícias
militares são velhas conhecidas dos movimentos populares, ainda mais
sob ordens de governos de direita.
A violência policial
contra os manifestantes é triste, revoltante, mas não
surpreendente. O que surpreende, neste caso, e é ainda mais
revoltante, é a postura adotada pela prefeitura da cidade de São
Paulo, governada pela aliança democrática, capitaneada por Fernando
Haddad (PT). O prefeito resolveu ser irredutível, e expressar-se por
meio de notas ou coletivas de imprensa. Afirma que não negocia de
jeito nenhum o aumento da tarifa, como se isso fosse demonstração
de força e firmeza. Não percebeu que os R$0,20 de aumento não
significa mais nada, o problema é maior e mais profundo. José
Eduardo Cardozo (PT), ministro da justiça do governo Dilma, ainda
deu uma forcinha. Colocou a Polícia Federal para investigar os
manifestantes e vem dando declarações seguidas ao gosto dos que tem
bico grande.
O método conservador
não serve a quem se pretende progressista. Se é para fazer como
sempre fez a direita brasileira, não precisa disputar eleições com
ela. O prefeito Haddad, e seus aliados, não entendeu que o centro da
questão não está no aumento da passagem, mas no direito do povo à
cidade e, agora, no direito a se manifestar. A tática de não
dialogar somente levará ao aumento dos protestos, e pior, ao aumento
da força da parcela conservadora presente aos protestos. É um tiro
no próprio pé.
Os confrontos acontecem
às vésperas da Copa das Confederações, momento em que o mundo
todo está olhando para o Brasil. As grandes empresas de comunicação,
nacionais e estrangeiras, tem tentado mostrar um clima de caos, como
se o Brasil estivesse em situação semelhante ao Egito de 2011. Isso
não é a verdade e não é por acaso. Cabe perguntar, quem é
favorecido com toda essa confusão, nesse momento? Alguém tem que
avisar aos governantes ditos progressistas que se trata da luta de
classes em curso.
E é exatamente por se
tratar da luta de classes que é preciso que os governos
progressistas abandonem o método dos reacionários, que se
contraponham a eles. É por se tratar de luta de classes que os
movimentos organizados, sindical, estudantil, comunitário, etc., tem
que engrossar as manifestações, usando seu poder de mobilização e
organização, deixando de ficar a reboque de governos, quaisquer que
sejam. Os partidos de esquerda tem que orientar seus militantes a
tomarem parte desse processo, urgente. É com a ação política, com
a mobilização popular, que será possível segregar os
conservadores e reacionários que tem tomado parte das manifestações,
unificando o povo em torno de reivindicações de maior alcance,
colocando a direita na defensiva.
Mas para isso, as
forças populares precisam deixar de priorizar os governos, que são
muito importantes, mas não são o todo. É necessário organizar o
povo, mobilizar o povo para avançar rumo a um país mais justo,
onde a juventude, os trabalhadores tenham direito às suas cidades,
tenham direito a ter sua voz ouvida.
*Jefferson Tramontini é
diretor do Sindicato dos Bancários do Ceará, membro da coordenação
nacional dos Bancários Classistas (CTB) e autor do blog Classista
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