O universo curvo dum revolucionário
Quando a miséria se multiplica e a esperança foge do coração dos homens, somente fica a Revolução Niemeyer
Laura Bécquer Paseiro
Niemeyer e Fidel |
A curva livre e sensual o definiu como arquiteto. A paixão pelos mais humildes, como revolucionário. O arquiteto Oscar Niemeyer Soares Filho, falecido quarta-feira, 5 de dezembro, aos 104 anos de idade, fez do seu Brasil um país de sonho, e da América Latina, seu reino.
Projetou, como os contornos de seus prédios, grande parte da identidade nacional brasileira e latino-americana.
Em 1940, conheceu o prefeito de Belo Horizonte, Juscelino Kubitschek, que o convidou para projetar uma igreja e um cassino, à beira do lago de Pampulha. Em 1956 é convidado para trabalhar no que seria sua criação mais significativa e completa: a cidade de Brasília, capital federal do Brasil, que projetou junto com seu colega, Lúcio Costa. Sendo o início dum estilo que o colocaria à vanguarda da arquitetura moderna, e na exploração das possibilidades construtivas e plásticas do betão.
Sobre sua obra, diria: "Não é o ângulo reto o que me atrai, nem a linha reta, dura, inflexível, criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual, a curva que me encontro nas montanhas do meu país, no curso sinuoso de seus rios, nas ondas do mar, no corpo da mulher preferida. De curvas é feito o universo todo, o universo curvo de Einstein".
Sobre esta fascinação do artista, o escritor Eduardo Galeano assinalou: "Niemeyer odeia o capitalismo e o ângulo reto. Contra o imperialismo não pode fazer muito. Mas contra o ângulo reto, opressor do espaço, triunfa sua arquitetura livre e sensual e leve como as nuvens".
Contudo, esta lenda da arquitetura considerou que sua maior obra foi entrar para o Partido Comunista do Brasil, que fundou com Luis Carlos Prestes. Quando em 1964 foi instaurada a ditadura militar no Brasil, seu escritório em Rio foi invadido e saqueado e seus projetos rejeitados. No exílio, na Europa, iniciou uma nova etapa de sua vida e obra. Niemeyer voltou a viver definitivamente no Brasil no início dos anos 80, após a abertura política.
O imperialismo não perdoa a Cuba nem a Fidel
Especial foi também sua amizade com Fidel Castro e a Revolução cubana. Sobre o processo indicou que nosso país "sempre soube transformar os reversos em vitórias" .
Obra de Niemeyer dedicada à resistência da Revolução cubana |
Tal foi sua admiração pela luta da Revolução, que um de seus últimos trabalhos, localizado na praça central da Universidade das Ciências Informáticas de Havana, representa um monumento contra o bloqueio econômico a Cuba.
Com formas ovaladas em aço e olhando para o céu, a escultura consiste num monstro de boca aberta e um cubano, com a bandeira na mão, enfrentando-o. A obra semelha uma sorte de David frente a Golias, como símbolo da resistência cubana.
Fidel, numa carta de agradecimento, expressou sua convicção de que o projeto seria "um reflexo das idéias que compartilham e pelas quais sempre têm lutado".
Incrivelmente lúcido aos 104 anos de idade, Niemeyer deixou este mundo para morar definitivamente na lenda. Com certeza, não descansará, não poderia fazê-lo até não se desentranhar a última curva deste universo.
Fonte: Granma
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